23/04/08

Entrevista com Alexander V. Pulenko, Piloto de Testes da Sukhoi



Alexander V. Pulenko é piloto de testes da russa KnAAPO (Komsomolsk-on-Amur Aircraft Production). É coronel da reserva da Força Aérea Russa e foi um dos primeiros pilotos a voar no Su-27P, ainda na década de 80. Serviu como piloto de caça da Defesa Aérea da Rússia e graduou-se como piloto de testes na Escola de Zhukovsky, em 1995.
Nesta Entrevista, concedida ao Departamento Comercial da KnAAPO, Alexander Pulenko fala de sua experiência profissional como piloto de testes da família do Su-27.

Como é ser piloto de testes e o que faz exactamente esse piloto?

-No meu caso, eu estava no comando da unidade de caças quando Anatoli Petrov, então director da KnAAPO, me fez uma proposta para que eu fosse trabalhar lá como piloto de testes. Eu aceitei e a partir daí, posso dizer, que a minha carreira profissional, vista de um novo ângulo, começou novamente.
Eu passei a frequentar a escola de pilotos de teste de Zhukovsky, a única deste tipo na Rússia. Muitas surpresas me aguardavam lá, a primeira delas dizia respeito ao tipo de treino. Na escola eu passei a receber um treino totalmente diferente do que havia recebido quando estava na Força Aérea. Uma grande ênfase era dada aos conhecimentos teóricos - aerodinâmica, dinâmica do voo, segurança de voo e conhecimento de estruturas. A técnica de pilotagem era levada à perfeição, de modo que você seja capaz de perceber as menores mudanças no comportamento das aeronaves e, em caso de problemas, pudesse reagir rapidamente evitando assim situações de perigo durante um voo de ensaio.
Desde o primeiro dia de actividade, normalmente, um piloto pensa que não há detalhes significativos na aviação. Isto é um engano, principalmente para um piloto de provas. A rotina do nosso trabalho com uma nova aeronave é exactamente o oposto disto, ou seja, temos de entender todos os detalhes que possam, normalmente, passar por insignificantes. Portanto, é importante discutir com pilotos mais experientes, aqueles que já realizaram inúmeros voos em diferentes aeronaves; faz parte da aprendizagem. Só assim conseguimos aumentar os nossos conhecimentos e aí, então, veremos que a vida de um piloto de testes não é tão fácil. Eu acredito que um piloto de testes é aquela pessoa que atingiu a quase perfeição a pilotar uma aeronave.

Qual o primeiro avião que pilotou?

-Após terminar o meu treino em 1995, eu retornei à KnAAPO. Nesta época, os primeiros Su-27, dedicados à exportação, estavam a ser entregues ao nosso primeiro cliente. Como eu já tinha voado neste tipo de aeronave, enquanto na Força Aérea, passei a voar essa variante. Este avião é extremamente ágil e tem uma potência excepcional.
A versão para exportação é denominada Su-27SK (Serial and Commerce) e difere-se da versão russa basicamente pelos equipamentos de bordo. O principal emprego deste avião é para supremacia aérea, assim como para patrulhamento e intercepção. Devido ao seu longo raio de acção, a aeronave possui armamento que inclui mísseis ar-ar de longo e médio alcances e também ar-terra.
A propósito, este avião foi o que teve maior sucesso comercial, em comparação com as outras aeronaves russas, durante a década de 90.

Qual foi o avião mais interessante para si?

-O Su-33, uma aeronave embarcada, que hoje opera no porta-aviões Almirante Kuznetzov. Devido a peculiaridades como uma elevada razão peso/potência e também pela sua aerodinâmica ela é uma aeronave interessante. Eu também considero o Su-35* como sendo um marco na minha carreira de piloto de testes. Este avião, membro da família Su-27, trouxe novos conceitos de sistemas embarcados e de ergonomia no cockpit. Eu tive a oportunidade de avaliar o seu sistema fly-by-wire além de entender toda a capacidade dos diversos sistemas electrónicos de bordo que, fundamentalmente, tornam o Su-35 um avião com um nível tal de automação que simplifica muito a tarefa de operá-lo. O Su-35, com a sua aerodinâmica avançada e a configuração canard, permite que façamos manobras que, desnecessário dizer, dão a essa aeronave uma vantagem significativa em combates aéreos.
Outro ponto interessante deste avião, e que avaliei num voo de dez horas de duração, sem paragens intermédias entre a fábrica da KnAAPO e Moscovo, diz respeito ao assento do piloto. Ele está projectado de tal forma que o corpo fica com uma inclinação onde os esforços sofridos pelo corpo do piloto, durante o voo, são adequadamente distribuídos e, desta forma, minimizam muito o cansaço**.
Alguns especialistas dizem que o Su-35, e a sua versão de dois lugares, o Su-35UB, são aeronaves de quarta geração, devido à sua performance. Estes caças de múltiplo emprego têm sistemas de armamento que permitem não só o combate aéreo mas também ataques ao solo empregando sistemas de mísseis guiados ar-terra. O controlo do impulso aliado a uma aerodinâmica perfeita dão ao Su-35 uma maneabilidade fantástica.

Você tem uma consideração especial por algum deles?

-Sim tenho uma consideração especial pelo caça Su-35UB. Eu chamo-o de Andorinha ("Swalow") pois ele é muito fácil de pilotar e isto proporciona muito prazer ao fazê-lo. Este avião tem uma óptima resposta nos três eixos de voo e é um avião muito "inteligente" no que diz respeito a controlo. Não são necessárias grandes deflexões das superfícies de comando para se obterem as respostas pretendidas. Também, por ser um piloto de origem militar, fico sempre muito atento aos desempenhos dos sistemas de armamentos. Neste avião os sistemas, totalmente automáticos, são capazes de detectar alvos a longa distância, determinar os mais importantes e definir os melhores mísseis para serem lançados. Basicamente, o piloto terá apenas que premir o botão de lançamento dos mísseis.
Além de todas essas características, o Su-35UB tem um sistema de navegação por satélites que proporciona a chegada do avião a um alvo exactamente num horário determinado, característica cada vez mais importante nos teatros operacionais de hoje em dia.
Tive também a participação em mais um outro projecto, o Su-30MK, caça desenvolvido pela KnAAPO e a Sukhoi Design Bureau. Uma série de inovações, pela primeira vez testadas no Su-35, foram incorporadas no Su-30MK, como, por exemplo, a substituição integral dos instrumentos de controlo de voo por similares totalmente electrónicos.

Qual a sua opinião sobre os aviões ocidentais?

-É uma coisa natural, para os pilotos, o interesse por outras aeronaves. No ano passado tive a oportunidade de visitar o Salão de Le Bourget e realmente fiquei impressionado com o grande número de aeronaves que lá estavam. Dos diversos aviões que vi, o F-18 foi o que mais ficou na minha memória. Acredito que ele esteja bem próximo do Su-35, mas não é capaz de superá-lo. Avaliei também alguns cockpits de diversos caças. O que mais me chamou a atenção foi o do Rafale, pois pareceu-me um completo buraco negro. No nosso cockpit nós temos cores diferentes para todos os instrumentos de modo a facilitar e tornar mais rápido o entendimento e uso de cada um. No Rafale, entretanto, todos os instrumentos são da mesma cor o que, a meu ver, dificulta a aprendizagem e uso de cada um. Não que um piloto não seja capaz de operar adequadamente os instrumentos mas certamente haverá um certo desconforto. Também no Rafale o cockpit é muito estreito, se comparado ao Su-35; a mim pareceu impossível instalar-me lá. De uma certa forma, creio que nós estamos muito à frente no que diz respeito a ergonomia.

Quais as peculiaridades que um piloto de testes encontra durante os testes das aeronaves em produção?

-Ao contrário do que acontece com outros colegas da Sukhoi Design Bureau, o trabalho do piloto de testes de produção tem uma certa rotina. Temos que seguir um roteiro de testes para cada avião e ele deve ser integralmente cumprido com sucesso. Cada novo avião é como um bebé que precisa de aprender tudo, ou seja, temos de verificar o funcionamento de todos os sistemas para garantir que tudo esteja funcionando na perfeição. Algumas vezes precisamos, juntamente com outros colegas da Sukhoi, discutir soluções para problemas que aparecem.
Todo o primeiro voo de um avião, mesmo que seja de um avião em produção, pode ter uma série de surpresas - de um problema com uma turbina até uma descompressão a 11 Km de altitude, como eu tive. Um ponto que gostaria de ressaltar é que nunca tivemos problemas com o sistema fly-by-wire dos nossos aviões.

Como deve ser a relação entre um piloto e a sua aeronave?

-Há uma conexão invisível entre o piloto e seu avião, o que faz dos dois um único elemento. Ao mesmo tempo que um avião não pode ser tratado como "um velho amigo" algumas vezes ele não perdoa se assim você não o faz. O piloto deve respeitá-lo, independentemente da sua grande experiência de voo, pois só assim será possível obter deste avião todo o seu potencial.

Entrevista retirada da revista: "Tecnologia & Defesa - Ano 19 Nº 90 - Edição Especial sobre a FAB"

Foto retirada de: Defesanet

*-O piloto refere-se ao antigo Su-35/T-10M.
**-Como eu já referi, no artigo sobre o Su-35 que pode ser encontrado aqui no blogue, o assento, o Zvezda K-36, foi reclinado 30º.

Pavel be proud of your legacy!!!!